domingo, 19 de setembro de 2010

Parabéns ao Tomás

O título engana. O jovem terminou, de facto, o liceu, embora este termo tenha sido, nos dias de hoje, substituído pela expressão "Ensino Secundário". Que o tenha feito ao abrigo do Programa "Novas Oportunidades" é perfeitamente irrelevante para o caso. Pelo que é dito na legenda da imagem, o Tomás fez exame a inglês e teve 20. Ora isto é importante e deve ser ponderado com cuidado: um 20 não é para qualquer um. Há por aí muito engenheiro diplomado que não conseguiria seguramente obter esta classificação num exame de inglês. Atrevo-me mesmo a dizer que poucos serão os alunos do ensino regular que conseguem um 20 em exame. A verdade é que o Tomás tem mérito. Tem o mérito de ter regressado à escola, ter concluído os seus estudos, ter realizado um exame e ter obtido uma classificação ao alcance de poucos. Seria interessante desenvolver um estudo para apurar quantos concluem o Ensino Secundário ao abrigo das N.O. e acedem ao Superior. Deve ser uma minoria minoritária. O mesmo já não pode ser dito dos alunos dos Cursos Profissionais e esta é uma injustiça muito superior.
De facto, começa a haver uma migração bastante substantiva para estes cursos, pois muitos dos Programas são uma réplica modular dos do ensino regular e um jovem verdadeiramente motivado acaba estes ciclo de estudos com uma média elevadíssima e com uma preparação académica válida para o acesso à faculdade. Realizar uma prova de acesso aproveitando os recursos que a escola proporciona (Sala de Estudo, Apoio aos Alunos, Oficinas de Línguas, de Matemática... etc) para desenvolver a preparação para a realização dessa prova é muito simples. Tenho visto muitos alunos deste cursos profissionais acederem ao superior sem qualquer tipo de dificuldade, até porque os Exames Nacionais são quase todos feitos na Rua Sésamo.
Nós, professores, queixamo-nos à exaustão que os alunos estão cada vez menos preparados, que o grau de iliteracia é cada vez maior, etc etc etc. Eu assisto a coisas indescritíveis: uma finalista universitária incapaz de ler o horário da CP, alunos que consideram que os comboios espanhóis são sempre mais rápidos do que os portugueses, porque demoram sempre menos uma hora a chegar... e outras anedotas. Que o Tomás tenha acedido à Universidade via um 20 obtido em Exame não me incomoda. Tem algum tempo para comprovar se merece lá estar ou não. Que alunos medíocres que acedem a Universidades privadas de terceira escolha concluam a Licenciatura com 18 de média e acedam aos Mestrados das públicas de primeira escolha às quais não haviam tido acesso antes preocupa-me mais. Que os alunos dos Cursos Profissionais recebam uma formação grátis, sem terem que pagar um livro, uma fotocópia ou uma visita de estudo, que chateiem quase toda a comunidade escolar, que façam 3,4, ou 5 vezes o mesmo teste até terem aprovação e depois disto acedam ao Ensino Superior incomoda-me mais. Quando olho para os meus alunos das turmas regulares, os jovens que querem ir para Medicina, ou Engenharia, ou Economia, ou Arquitectura e lhes explico que cada vírgula fora do sítio e que cada acento gráfico por colocar são objecto de penalização, enquanto na sala ao lado os alunos do Profissional estão em Visita de Estudo às Caves do Vinho do Porto, sinto toda a parvoíce de um sistema que pouco tem de educativo. Quando olho para o recibo do meu vencimento e vejo os descontos que faço e pondero - apenas por nano-segundos - para onde vai esse dinheiro, até eu penso se não haverá Novas Oportunidades para mim. Longe da "austera, apagada e vil" pátria lusitana.

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